Joker: Delírio a Dois.

"There's always a joker in the pack. There's always a lonely clown"

Em 2019, ocorreu uma febre envolvendo Joker a qual foi inevitável. Há os que gostaram, os que odiaram, os que não tiveram uma opinião formada, mas ninguém passou batido. Também pudera, o filme de Todd Phillips foi um tormento cultural, sucesso de público e crítica, rendendo mais de um bilhão em bilheteria e indicado a 11 Oscars, se consagrando com duas vitórias. 

Após todo o sucesso, uma inevitável (ainda que desnecessária) continuação começa a ser planejada. Em 2021 após negociações a sequência ganhou carta branca e em 2022, após a confirmação de Lady Gaga como co-estrela, a produção tem início. Em meio a regravações, especulações megalomaníacas, burburinhos da imprensa e uma campanha publicitária gigantesca, em 3 de outubro de 2024, chega aos cinemas a estimada sequência. 

“Folie à Deux” tem início onde o filme original parou. Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) encontra-se preso no Asilo Arkham enquanto aguarda sua condenação final. Em meio à maus-tratos por oficiais da justiça, processos judiciários e ao convívio com outros detentos, Arthur se encontra com Lee Quinzel (Lady Gaga) e a dupla dinâmica, entre cantorias e performances imaginárias, tocam o terror em Gotham City. 

Coringa, infelizmente, não prova para o que veio. O cerne do roteiro se sustenta totalmente em relembrar tudo que aconteceu no primeiro filme e se apoia em uma lembrança imagética do que já passou. É um filme que muito diz e pouco mostra, com diálogos expositivos ao extremo, que reiteram para o espectador toda a violência e psicopatia que o personagem de Fleck representa, mas sem chegar às vias de fato. 

A direção de Todd Phillips é bem feita, o design de produção, fotografia e a direção de arte estão estruturadas e bem feitas. Porém, de nada adianta toda a competência técnica quando o material a se trabalhar é um roteiro desleixado e inconsistente, somado a uma montagem insegura de sua própria proposta. 

Apesar da seleção musical precisa e da excelente coreografia de seus atos, a trilha encontra-se mal posicionada, em momentos há excesso; em outros, ausência. O filme não decide se será ou não um musical, e mesmo já sendo, tem medo de assumir a forma. Do mesmo pode se dizer para a trama judiciária, que não se sabe conduzir e acaba resultando em sequências verborrágicas que quando não entediantes, apoiam-se em todas as muletas do primeiro filme. 

O elenco é muito bom, mas não tem o que trabalhar. O Joaquin Phoenix mantém a incorporação que foi construída no primeiro filme e a sustenta muito bem, ele carrega uma fluidez que é tão bem incorporada que você crê no ator como um personagem real e não como um ator replicando sua própria criação, o que seria muito fácil e justificável, mas ele inova e não cai em reimpressões (ainda que o filme o tempo inteiro o induza para tal). No âmbito musical ele se porta muito bem, e mesmo com toda a caricatura que é posta, ele não desaparece ou fica menor perante sua colega de cena.

A Catherine Keener e o Brendan Gleeson sempre estão muito bem, mesmo em papeis aquém de seus talentos. Keener interpreta a advogada que acredita na liberação de seu cliente e Gleeson, o policial malvado que canta e faz piadas porcas; ambos muito bem entregues e colocados, mas em papeis maniqueistas. A Zazie Beets, que é outra excelente atriz, tem uma pontinha bem alocada, mas, novamente, sofre dos defeitos já citados.

Lady Gaga, o nome mais aguardado, é subutilizada. Aparece menos do que foi promovida, se porta monossilábica, é mais uma muleta do Joker do que um personagem trabalhado. Ela brilha em todas as cenas musicais; mas isso já é óbvio, e até triste pois temos muito dela como Lady Gaga, mas pouco como Harley Quinzel. 

Joker, nos apresenta um delírio mesmo: um delírio de Todd Phillips ao achar que poderia ter feito um filme bom. Apesar de tecnicamente e esteticamente impecável, o roteiro assemelha-se a uma colcha de retalhos imprecisa e mal costurada. Um material que muito diz e nada mostra; como musical é mal alocado; como drama judicial falta sustentação e decoro. Falha na ação, no drama e na comédia. Um filme coberto pela sua sombra original e se pauta apenas pelo legado, um legado que acaba de ser destroçado por si mesmo. 

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